Este texto é fruto de anotações durante as aulas no curso, “A interpretação deleuzeana de Proust” ministrada pelo Prof. Dr. Roberto Machado no IFCS. Disciplina da Pós Graduação em Filosofia, UFRJ, 1º Semestre de 2009.
Proust e a Música (Baseado no livro “Proust musicien” de Jean-Jacques Nattiez)
Proust gosta de dar pinceladas nos temas; o tema aparece, some e reaparece. Nessas pinceladas, ele passeia pela música, cujo, a primeira execução tem o nome de arquétipa; é a primeira vez que Swann ouve uma sonata. Outra execução ocorre na casa dos Verdurin; o terceiro momento é a sonata tocada ao piano por Odette para Swann; o quarto momento é a sonata tocada ao piano na casa dos Verdurin; a quinta vez é a sonata ao piano e violino na casa de Euverte.
Proust não se interessa muito pelos aspectos teóricos da música, pois não está interessado em criar conceitos sobre a música. Proust está preocupado em como o sentir a música; como é que a música é sentida afetivamente? A música é apresentada de forma romanesca criando cenas enquanto a música é tocada. Apresenta as idéias e sensações de dois personagens: Swann e o Narrador. Proust mostra as mudanças que eles passam na sua relação com a música. Eles mudam de escuta na relação com a música e aparece evidente que haverá um aprendizado.
A música é a condição de possibilidade para a literatura, sendo que, essa idéia tem relação com Nietzsche. Proust está influenciado por Wagner e Schopenhauer. É preciso levar em consideração as passagens em que Proust fala de música; é preciso tratá-las na ordem porque há mudança de escuta entre o narrador e Swann. Como Swann pensa e sente a música? Começa quando Swann ouve parte de um arranjo para piano; essa parte é o Andante. A relação parte e todo é fundamental na estética de Proust. Essa Sonata é em fá sustenido maior e ele ouve na casa dos Verdurin.
Proust critica a escuta burguesa porque eles, embora patrocinassem os artistas, eles não entendiam nada de escuta. Proust critica a incapacidade burguesa de captar os detalhes que fazem a diferença numa apreciação musical. Proust fala da pequena frase, além disso, ele foi capaz de assimilar a materialidade dos sons, isto é, a qualidade material dos sons tirados pelos instrumentos. Proust foi capaz de assimilar a música pura.
A gente não entende nada porque falta a memória. A música é uma arte temporal, e a memória é capaz de relacionar as partes com os movimentos. A memória é como um operário que trabalha para estabelecer fundações duradouras. Proust descrevia Swan a partir de Debussy. O musicólogo canadense Jean-Jacques Nattiez defende que existem três compositores que estão por detrás da Sonata de Vanteuil são: Debussy, Wagner e Beethoven.
Proust valoriza os fragmentos sonoros, e isso, remete a Swann que ao detectar esse trecho musical ele vai, em busca de um amor desconhecido. Proust valoriza a arte que se relaciona com o amor. Swann é o amoroso, pois para ele, viver é amar. Proust adorava Baudelaire, inclusive, Proust declarou-o como sendo o maior poeta do século XIX, já que Proust ambicionava ser o melhor poeta do século XX. Baudelaire criava passante e por incrível que pareça, a famosa canção “Garota de Ipanema” é uma passante de Baudelaire cujo, versos diziam: “fugitiva beleza, cujo, o olhar me faz renascer; imagem de uma beleza nova que me dá uma sensibilidade”. Vinícius de Moraes, como era literato, acabou “roubando” algumas idéias baudelairianas.
Swann renasceu, pegou fogo quando ele ouviu aquele som. Caso semelhante ocorreu com o Zaratustra de Nietzsche que era cinza e virou fogo. Marcel Proust fala da música como realidade invisível, e essa realidade invisível é a realidade espiritual que se constitui a realidade essencial da música. Swann é tocado por essa música como sendo essência, mas ele nunca deu conta do absoluto porque ouvia racionalmente. Swann vislumbra na música um novo mundo; fala da música como sendo um mundo da essência e vislumbra uma essência superior, porém, remete ao amor.
Em Proust há a personificação feminina nas pequenas frases sendo que a música é o hino nacional do seu amor. Em Proust, o amor está vinculado ao ciúme; o ciúme é um tema importante porque o Amor de Swann corresponde ao Ciúme de Swann. Vinicius de Moraes em uma de suas canções escreveu que o ciúme é o perfume do amor. O poetinha brasileiro era proustiano, pois segundo Proust, “amamos para ter ciúmes”.
Proust viu a plenitude na arte, no prazer da escuta des-racionalizada, aliás, a função da arte é dar prazer (postulado estético desde Aristóteles). O interessante é que em Swann, a música aparece como realidade acima das coisas concretas que ele não sabe interpretar. Porque essa incapacidade? Simplesmente porque ele confundiu o signo com objeto, pois nós amamos os signos, então, diante dessas circunstâncias, ele transfere para Odette a pequena frase. Swann percebeu que a pequena frase tem o poder de atingir o mundo diverso.
O artista é aquele que tem as faculdades capazes de dar conta das essências. O artista conta com o apoio de alguns pensadores como Schopenhauer e Bergson que desvalorizaram a razão em nome da intuição. Pela intuição, o artista pode ir além da aparência e ter um caso de amor com a essência. Nos braços da intuição há a força visionária que impulsiona o artista para o além. Grandes cineastas do cinema moderno embarcaram nessa onda e criaram um cinema visionário que foi capaz de dizer o indizível, de ver o invisível e de ouvir o inaudível. Deleuze aplaudiu e defendeu com unhas e dentes esses visionários e desbravadores da arte.
Leia também o texto PROUST E A CONCEPÇÃO DE ARTISTA.
http://filmesdejoe.blogspot.com/2012/03/proust-e-concepcao-de-artista.html
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