"Em pouco tempo adquire a malsã, a mórbida faculdade de dizer a verdade: começa
a verificar todas as afirmações feitas em sua presença, não hesita em contradizer os
mais moços, e muitas vezes acaba por escrever romances tão fiéis à vida que
perdem toda verossimilhança". (WILDE, 1994, p. 30)
Autor: Oscar Wilde
Editora: Imago
Ano: 1994
Confira uma trechinho do ensaio
Dificilmente se avaliaria o dano que faz à literatura o errôneo ideal da nossa época! Tem-se uma maneira desprezível de falar do "mentiroso nato e do poeta nato". Em qualquer dos casos, é um detrimento. A mentira e a poesia formam artes - artes que, como Platão entendia, têm a sua conexão e requerem o estudo mais atento, a mais desinteressada devoção. Possuem a própria técnica, como a pintura e a escultura - mais materiais - têm seus sutis segredos de forma e de cores, seus toques de mão e métodos refletidos. Reconhece-se o poeta pela sua bela música e o mentiroso pelos seus ricos e ritmados excessos - aos quais não bastaria em caso algum a inspiração temerária do momento; nisto, como em tudo, a perfeição é precedida pela prática. Hoje, porém, enquanto a moda de fazer versos vai se tornando excessivamente comum e deve ser arrefecida, a de mentir quase cai em descrédito. Mais de um jovem começa a vida com um dom exagerativo natural. Se o educam em círculos simpáticos e do mesmo espírito, ou pela imitação dos melhores modelos, pode-se tornar qualquer coisa de grande, de prodigioso. Em geral, porém, o jovem não alcança coisa alguma. Ou cai em negligentes hábitos de exatidão, ou começa a frequentar os velhos e bem-informados. Uma ou outra alternativa é fatal à sua imaginação, como aliás seria à imaginação de quem quer que seja. Em pouco tempo adquire a malsã, a mórbida faculdade de dizer a verdade: começa a verificar todas as afirmações feitas em sua presença, não hesita em contradizer os mais moços, e muitas vezes acaba por escrever romances tão fiéis à vida que perdem toda verossimilhança.
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Biografia resumida sobre Oscar Wilde.
Oscar Fingal O´Flahertie Wills Wilde nasceu em Dublin, Irlanda, a 16 de outubro de 1854, filho de Sir William Wilde, famoso médico. Quando jovem acompanhou as discussões literárias e estéticas do grupo de amigos de sua mãe, Jane Francisca Elgee, que publicava poesia sob o pseudônimo de ´Speranza´. Estudou em Oxford, devotando-se aos clássicos e a criar uma imagem de si mesmo que ´estivesse à altura´ da porcelana chinesa que mantinha, junto com outros objetos de arte, em seu quarto. Com seu visual (cabelos longos, veludo caro, flores) e maneiras de ´esteta´ (algo efeminadas e dedicadas a prezar o belo e a ´arte pela arte´), Wilde procurou aparecer como o apóstolo de um novo culto estético. Em Oxford, porém, esse comportamento só lhe conseguiu um banho forçado num riacho e uma devassa em seu quarto, que os outros estudantes, ignorantes do valor da arte e do bom-tom, levaram a cabo, e não só por brincadeira. Fora da universidade teve mais sorte e influência, e ficou famoso por seu ´wit´ (engenho, inteligência) e por sua personalidade. Suas frases de efeito eram repetidas em todo o lugar, e a fama de líder desse novo movimento estético lhe valeu um convite para palestrar nos Estados Unidos. Casou-se em 1884 com Constance Lloyd, publicou em 1888 os contos de ´O príncipe feliz e outras histórias´. Seguiram-se outros livros de contos e o romance ´O retrato de Dorian Gray´ (1891), uma história simbólica sobre vaidade e punição escrita em estilo epigramático: muitas das falas dos personagens foram recolhidas como aforismos. Apesar desses livros, a popularidade de Wilde cresceu mesmo no teatro, com peças irônicas e brilhantes como ´O leque de Lady Windermere´ (1892) e ´Um marido ideal´ (1895). Essa rápida ascensão apagou-se com uma queda meteórica. Seu envolvimento homossexual com o jovem Lord Alfred Douglas foi denunciado pelo pai deste. Wilde processou seu acusador por calúnia, perdeu e foi condenado a dois anos de prisão (a ´sodomia´ era crime então). Foi à bancarrota em pouco tempo, consumiu-se em desgosto, deixou família (mulher e dois filhos) e exilou-se em Paris, sob o pseudônimo de Sebastian Melmoth. Ali morreu, na obscuridade, a 30 de novembro de 1900.
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