“Um escritor, ou
todo homem, deve pensar que tudo o que lhe ocorre é um instrumento, todas as
coisas lhe foram dadas para determinado fim – e isso tem de ser mais forte no
caso de um artista. Tudo o mais acontece a ele, inclusive as humilhações, as
vergonhas, as desventuras, todas essas coisas lhe foram dadas como argila, como
matéria-prima para sua arte; ele tem de aproveitá-las. Por isso já falei num
poema do antigo alimento dos heróis: a humilhação, a desgraça, a discórdia.
Essas coisas nos foram dadas para que as transmutemos, para que façamos, da
miserável circunstância de nossa vida, coisas eternas ou que aspiram a sê-lo”.
Jorge Luis Borges. Borges oral & sete noites. São Paulo: Companhia Das Letras, 2008.
Uma vez
perguntaram a Bernard Shaw se ele acreditava que o Espírito Santo havia escrito
a Bíblia: Ele respondeu: “Todo livro que vale pena reler foi escrito pelo
Espírito”. Ou seja, um livro tem que ir além da intenção do seu autor. A
intenção do autor é uma pobre coisa humana, falível, mas no livro tem de haver
mais. O Quixote, por exemplo, é mais que uma sátira de livros de cavalaria. É
um texto absoluto no qual não intervém absolutamente, de nenhuma maneira, o
acaso.
Jorge Luis Borges. Borges oral & sete noites. São Paulo: Companhia Das Letras, 2008,
página 15.
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