Sugerido ou
estimulado pelos espelhos, as águas e os irmãos gêmeos, o conceito de duplo é
comum a muitas nações. É plausível supor que expressões como Um amigo é um
outro eu de Pitágoras ou o Conhece-te a ti mesmo platônico se inspiraram nele.
Na Alemanha chamam-no Döppelgänger; na Escócia Fetch, porque vem buscar (fetch)
os homens para levá-los à morte. Encontrar-se consigo mesmo é, por conseguinte,
funesto; a trágica balada Ticonderoga, de Robert Louis Stevenson, conta uma
lenda sobre esse tema. Recordemos também o estranho quadro How they met themselves,
de Rossetti: dois amantes se encontram consigo mesmos, no crepúsculo do bosque.
Caberia citar exemplos análogos de Hawthorne, de Dostoiewski e de Alfred de
Musset. Para os judeus, pelo contrário, a aparição do duplo não era presságio
de morte próxima. Era a certeza de haver alcançado o estado profético. Assim o explica
Gershom Scholem. Uma lenda recolhida pelo Talmude narra o caso de um homem em
busca de Deus, que se encontrou consigo mesmo. No conto Willian Wilson, de Poe,
o duplo é a consciência do herói. Ele o mata e morre. Na poesia de Yeats, o
duplo é nosso anverso, nosso contrário, o que nos
complementa, o que não somos nem seremos. Plutarco escreve que os gregos deram
o nome de outro eu ao embaixador de um rei.
Extraído de:
BORGES, Jorge Luis. Livro dos seres imaginários. São Paulo:
Companhia Das Letras, 2007, páginas 85 e 86 .
Livro dos Seres Imaginários
Recomendo a leitura deste artigo disponível no link abaixo:
BORGES E O OUTRO: UMA ANÁLISE PSICOLÓGICA DO DUPLO.
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