quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Terras e Fronteiras no Cinema Político Contemporâneo, autora: Andréa França

O livro pretende pensar a abordagem de filmes contemporâneos sobre a questão da internacionalização, particularizando o tema: refugiados e desvalidos, imigrantes, estrangeiros em busca de melhores condições de vida, tema recorrente nas imagens cinematográficas dos anos 90.

Autor: Andréa França
Editora: 7 Letras
Número de páginas: 235
Ano de lançamento: 2003

 

Prof.Dra.Andréa França é professora do departamento de cinema da PUC RIO. Tive a imensa honra de estudar com ela numa disciplina na ECO-UFRJ "Cinema e Cultura de Massas" em 2009, em parceria com a profa. dra. Consuelo Lins. Conheci a Andréa França assistindo os EXTRAS dos 3 DVDS dos 3 filmes sobre a TRILOGIA DAS CORES do cineasta polonês.

 

Recomendo a crítica de Marcelo Coutinho

http://www.marcelomoutinho.com.br/resenhas/2007/04/terras_e_fronteiras_no_cinema.php

Cinema de fronteiras abertas

Na coletânea O Cinema e a Invenção da Vida Moderna, que chegou às livrarias brasileiras no ano passado pela Editora Cosac & Naify, alguns dos principais ensaístas norte-americanos demonstram como o crescimento das cidades e o acelerado desenvolvimento tecnológico possibilitaram a formação de uma nova subjetividade, que viria a desembocar (ou prenunciar) na experiência cinematográfica. Antes mesmo de se efetivar materialmente, o cinema insinuava-se, já no final do século XIX, como possibilidade - evidenciam os estudos publicados no livro, com base em temas tão diversificados como a popularidade dos cartazes de publicidade da época, a grande procura pelos museus de cera ou o sucesso dos catálogos de vendas.

O desafio a que Andréa França se propõe em Terras e Fronteiras no Cinema Político Contemporâneo, que acaba de ser lançado em parceria pela Editora 7 Letras e a Faperj, corre no sentido contrário. A partir de seis filmes, todos produzidos durante a década de 90, ela pretende demonstrar que também o cinema tem a capacidade de “criar”, e o vem fazendo nos dias em que vivemos. Mais do que qualquer traço estético, o que os filmes incluídos no estudo - A Viagem (Fernando Solanas), Gosto de Cereja (Abbas Karostami), Trem da Vida (Radu Mihaileanu), Terra Estrangeira (Walter Salles e Daniela Thomas), Underground – Mentiras de Guerra (Emir Kusturica), Antes da Chuva (Milcho Manchevski), Bela Aldeia Bela Chama (Srdjan Dragojevic) e Estorvo (Ruy Guerra) - apresentam em comum é a condição de seus personagens: em permanente deslocamento, transitando no aparentemente caótico fluxo da estranha cartografia do mundo atual.

Diante da diluição das fronteiras nacionais, étnicas, culturais e ideológicas, seus “sobreviventes” – desvalidos, imigrantes, estrangeiros – buscam referências e, se possível, seu “cadinho de terra”. “Uma pergunta atravessa esses filmes: Que mundo é esse? Como foi que se conseguiu extirpar, de forma tão radical e violenta, qualquer princípio ético de fraternidade e compaixão, num mundo que até há pouco se orgulhava de ser herdeiro das tradições iluministas e humanistas?”, explica Andréa em certa passagem do livro. Se não têm ainda a resposta, os filmes estudados explicitam tal questão, levando-a ao espectador.

A autora não nega a subida ao ringue quanto se trata de opor sua idéia sobre a análise fílmica da visão de pensadores consagrados, como Frederic Jameson. Em contraste com o neomarxismo de Jameson, cuja lógica binária opõe ao cinemão hollyodiano (atrelado ao imperialismo) uma espécie de “terceiro cinema”, que emergeria das margens; Andréa defende um filme que fale “para além da cultura”, “singular em sua materialidade sensível”, e não “enunciado de reconhecimento sobre algo que lhe antecede”, em conceito bem próximo de Gilles Deleuze. O cinema não seria “representação”, mas uma “imagem do mundo”.

O pensamento de Deleuze, aliás, se faz presente no decorrer de todo o estudo. Como poucos analistas, Andréa é muito feliz em sua explicação sobre as formulações deleuzianas sobre a “imagem-movimento” e a “imagem-tempo”. Isto apesar da aridez das questões trabalhadas e do tom fortemente acadêmico do texto - o livro é uma adaptação de sua tese de doutorado na UFRJ.

Centrada nessa visão do filme como função criadora, ela sublinha que as produções arroladas no livro são capazes de “inventar nações múltiplas e precárias em seus modos de manifestação, um domínio capaz de fundar comunidades de sentimento sob novas espacialidades”. Afinal, se o cinema é um meio de expressão extensivo, que consegue acentuar “identidades” mesmo em uma comunidade de diferentes e a partir de uma “adesão silenciosa”, poderia crivar entre esses personagens imersos na instabilidade, em trânsito, sem fronteiras, noção de morada ou lugar, uma forma qualquer de identidade.

Inventar nações onde elas não existem, fundadas numa solidariedade que se calca em afetos, novos mapas de pertencimento, ou, como prefere Andréa, “uma reidentificação imaginária, longe das identidades políticas ou nacionais dadas”, que cria novas formas de visibilidade e sensibilidade para “um estado de mundo difuso”. Essas “novas imagens” revelariam um terceiro momento do cinema, para alem da narrativa clássica (construída com imagens-movimento) e do moderno (que nos trouxe as imagens-tempo), mas que tabelaria com ambos, procurando espaços vagos, fronteiriços, o “entre”. Com sua ousada teoria – e seu evidente otimismo -, Andréa parece subscrever a célebre frase de Tarkovski, quando ele afirma que “o poeta não usa descrições do mundo, ele próprio participa da sua criação”.

Resenha publicada no site Críticos.com

Prof.Dra.Andréa França é professora do departamento de cinema da PUC RIO

Terras e Fronteiras no Cinema Político Contemporâneo - França, Andréa

 

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