(NIETZSCHE,
FRIEDRICH. Humano Demasiado Humano. Volume II. Tradução de Paulo César de Souza. São
Paulo: Companhia Das Letras, 2002)
(NIETZSCHE, FRIEDRICH. Humano Demasiado Humano. Volume II. Tradução de Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia Das Letras, 2002)
Expressar apenas
pensamentos seletos ao conversar com pessoas desconhecidas ou não muito
conhecidas, falar dos amigos célebres, de experiências e viagens importantes é
indício de não ser orgulhoso, ou ao menos de não desejar parecer que é. A
vaidade é a máscara de polidez do orgulhoso. (p. 112)
Com pessoas a
quem falta o respeito que é pessoal não devemos andar, ou devemos antes
colocar-lhes, implacavelmente, as algemas da compostura. (p. 112)
A boa amizade
nasce quando se preza bastante o outro, mais do que a si mesmo; quando também
se ama o outro, mas não tanto quanto a si mesmo, e quando, para facilitação do
trato, sabe-se juntar a isso uma tintura e penugem de intimidade, mas
sabiamente guardando-se, ao mesmo tempo, da verdadeira intimidade, e evitando
confundir Eu com Você. (p. 112,113)
Quando mudamos
muito, nossos amigos que não mudaram se tornam fantasmas do nosso passado: sua
voz nos chega vaga e horripilante – como se ouvíssemos a nós mesmos, porém mais
jovens, mais duros e imaturos. (p. 113)
Todas as pessoas
que deixamos esperar por muito tempo na antecâmara do nosso favor, entram em
fermentação e ficam azedas. (p. 115)
Quando velhos
amigos se revêem após uma longa separação, com freqüência sucede aparentarem
interesse ao falar de coisas que se tornaram indiferentes para eles: e às vezes
ambos o percebem, mas não ousam levantar o véu – graças a uma triste dúvida.
Assim nascem conversas como que no reino dos mortos. (p. 116)
Raramente
quebramos a perna quando subimos trabalhosamente na vida, mas sim quando
começamos a fazer corpo mole e tomar os caminhos fáceis. (p. 118)
Todo grande amor
traz consigo o cruel pensamento de matar o objeto do amor, para subtraí-lo de
uma vez por todas ao sacrílego jogo da mudança: pois o amor tem mais receio da
mudança do que do aniquilamento. (p. 122)
Dizer duas vezes
– É bom exprimir algo duas vezes, dando-lhes um pé direito e um pé esquerdo. A
verdade pode se sustentar numa só perna; mas com duas ela andará e circulará.
(p. 171)
A proibição sem motivos – Uma proibição
cujo motivo não entendemos ou não admitimos é, não só para o homem teimoso, mas
também para o ávido de conhecimento, quase uma injunção: chega-se a testá-la,
para assim descobrir por que houve a proibição. Interdições morais, como as dos
dez mandamentos, são adequadas apenas para épocas de razão subjugada: hoje em
dia, uma proibição como “não matarás”, “não cometerás adultério”, enunciada sem
motivos, terá um efeito antes pernicioso do que útil. (p.194)
Com a imitação,
o ruim ganha prestígio, o bom perde – sobretudo na arte. (p. 151)
Sinal de grandes mudanças – Se sonhamos
com pessoas há muito esquecidas ou mortas, este é um sinal de que passamos por
uma grande mudança e de que o chão em que vivemos foi totalmente revolvido:
então os mortos se levantam e nossa antiguidade se converte em novidade. (p.
151)
Perigo na admiração. – Na excessiva
admiração por virtudes alheias, pode-se perder o gosto em suas próprias
virtudes e, por falta de exercício, finalmente perdê-las, sem adquirir as
alheias em troca. (p. 146)
Da terra dos canibais - Na solidão o
solitário devora a si mesmo, na multidão o devoram muitos. Agora escolha. (p.
144)
É preciso saber
obscurecer-se, a fim de livrar-se do enxame de admiradores importunos. (p. 148)
Muitas coisas
precisamos deixar no Hades do sentir semiconsciente e não querer salvar de sua
existência sombria; do contrário elas se tornam, como pensamento e palavra,
nossos amos demoníacos, e exigem cruelmente o nosso sangue. (p. 150)
Perseguidor de
Deus. – Paulo concebeu, Calvino retomou a idéia de que a danação se acha
eternamente aplicada a um sem-número de indivíduos, e que esse belo plano
universal foi estabelecido para que nele se manifeste a glória de Deus; ou
seja, céu e terra e humanidade devem existir para – satisfazer a vaidade do
Senhor! Que cruel e insaciável vaidade deve ter cintilado na alma daquele que
concebeu ou reconcebeu algo assim! – ou seja, Paulo continuou Saulo, afinal – o
perseguidor de Deus. (p. 209, aforismo 85)
Perigo na pessoa - Quanto mais Deus foi
considerado como pessoa, tanto menos as pessoas lhe foram fiéis. Elas se apegam
muito mais às suas idéias do que àquelas que mais amam: por esse motivo se
sacrificam pelo Estado, pela Igreja e também por Deus – enquanto ele continua seu produto, sua idéia, e não é tomado muito pessoalmente. Neste último caso,
quase sempre discutem com ele: até o homem mais devoto já deixou escapar a
amarga exclamação: “Meu Deus, por que me abandonaste”¿. (p. 206, 207, aforismo
nº 80)
O que é
“obstinado”¿ - O caminho mais curto não é o mais reto possível, mas aquele em
que os ventos mais favoráveis inflam nossas velas: eis o que diz o ensinamento
dos navegantes. Não segui-lo é ser obstinado: a firmeza de caráter é aí
maculada pela estupidez. (p. 198, aforismo nº 59)
O conteúdo da consciência moral. - O conteúdo de nossa consciência moral é tudo
que, nos anos da infância, foi de nós exigido regularmente e sem motivo, por
seres que adorávamos ou temíamos. A partir da consciência moral é despertado,
então, o sentimento de obrigação (“isso tenho que fazer, isso não) que não
pergunta: por quê¿. – Nos casos em que algo é feito com o “porque”, o ser
humano age sem consciência moral; mas nem por isso contra ela. – A crença em
autoridades é a fonte da consciência moral: logo, não é a voz de Deus no
coração da pessoa, mas a voz de algumas pessoas na pessoa.
(p. 195,
aforismo nº 52)
Esqueletos
pintados. Esqueletos pintados: são os autores que querem substituir por cores
artificiais o que lhes falta de carne.
(p. 230 ,
aforismo 147)
Quando se é
mal-entendido como um todo, é impossível erradicar inteiramente um
mal-entendido específico. Deve-se levar isso em conta, para não gastar forças
em sua própria defesa inutilmente.
(Página 143,
parte I, aforismo nº 346)
Bens móveis e
bens de raiz. – Quando a vida tratou alguém de maneira totalmente rapace,
tirando-lhe tudo o que podia em matéria de honras, alegrias, seguidores, saúde,
propriedade de toda espécie, talvez esse alguém descubra mais tarde, após o
assombro inicial, que é mais rico do que antes. Pois somente então ele sabe o
que lhe é tão próprio que ladrão nenhum pode tocar: e, assim, talvez saia de
toda a pilhagem e desordem com a nobreza de um grande proprietário de terras.
(p. 142, Parte
I, aforismo 343)
A posse possui.
– Apenas em certa medida a posse torna o homem mais livre e independente; um
grau adiante – e a posse torna-se senhor, e possuidor, escravo; ele tem de lhe
sacrificar seu tempo, sua reflexão, e de ora em diante sente-se obrigado a
freqüentar determinado círculo, sente-se atado a um lugar, incorporado a um
Estado: tudo isso, talvez, contrariando sua necessidade mais íntima e
essencial.
(Página 132,
aforismo nº 318)
[...] A vida
espiritual deve voltar a ser verdadeiramente real em nós – é preciso que
adquira um ímpeto nascido do pessoal, que nos derrube e force a nos levantarmos
de verdade - e esse ímpeto só se
manifesta como legítimo na simplicidade, não no esnobe decadente, no
forçado...Vida espiritual só pode ser vivida e configurada de modo que os
participantes sejam atingidos por ela diretamente em sua existência [...]
MARTIN HEIDEGGER
citado por RÜDIGER SAFRANSKI. Heidegger um mestre na Alemanha entre o bem e o
mal. São Paulo: Geração Editorial, 2000, página 119
[...] “escrever
melhor significa contemporaneamente também pensar melhor; encontrar coisas
sempre mais dignas de serem comunicadas e saber de fato comunicá-las”. [...].
“Ora, o bom autor não se distingue só pela força e concisão do seu raciocínio.
Ele também se adivinha, se fareja, contanto que seja homem de nariz fino. Um
escritor assim se obriga e se dedica constantemente antes de tudo a estabelecer
e a tornar sempre mais sólidos, de modo rigoroso, os seus conceitos (a unir
conceitos unívocos às suas palavras) e, antes que isto aconteça, não gosta de
escrever”.
FRIDRICH
NIETZSCHE citado por DOMENICO LOSURDO em NIETZSCHE O REBELDE ARISTOCRATA:
Biografia intelectual e balanço crítico, Editora Renan, página 865.
“Tácito relata
que Cristo, autor e primeiro responsável pela difusão da superstição e do contágio,
é condenado “ao suplício por ordem do procurador Pôncio Pilatos”. Em O Anticristo vemos Pilatos representar a
“ciência” ao passo que Jesus e Paulo exprimem a “fé”, a qual não é senão “o
veto à ciência” (AC, 47). A primeira luta entre luzes, ciência e tolerância,
por um lado, e fé e fanatismo, por outro, ocorre já no ocaso do mundo antigo:
de um lado está Pilatos, que declara que não sabe o que é a verdade, do outro
lado está Jesus, que com ela pretende identificar-se: “O nobre sarcasmo de um
romano, ante o qual se comete um vergonhoso abuso da palavra ‘verdade’,
enriqueceu o Novo Testamento com a única palavra que tem valor – que é a sua
crítica e até a sua aniquilação: ‘o que é a verdade¿ Nietzsche não esconde,
antes sublinha a dimensão social do conflito. À atitude que segue os princípios
do ceticismo e da tolerância da classe dominante de Roma, satisfeita consigo,
se opõe a necessidade de certezas dogmáticas do “escravo”, inspirado e agitado
por idéias loucas de emancipação.”
DOMENICO
LOSURDO, NIETZSCHE O REBELDE ARISTOCRATA: Biografia intelectual e balanço
crítico, página 854.
“Para o pensador
e para todos os espíritos inventivos, o tédio é aquela desagradável ‘calmaria’
da alma, que precede a viagem venturosa e os ventos joviais; ele tem de suportá-la,
tem de aguardar em si o seu efeito”.
Friedrich
Nietzsche citado por Domenico Losurdo em Nietzsche o rebelde aristocrata,
editora Revan, página 945.
Intrínseca e
intoleravelmente “oriental” é um deus “ávido de honras na sua sede celeste”,
que vê um crimen lesae maiestatis no
pecado de toda mínima infração à norma por ele soberanamente publicada. Não
obstante o seu poder desmedido, ele é também “ávido de vingança” e exige de
cada homem uma humilhação terrível e
igual, com a completa renúncia de todo senso de dignidade.” Ser
contrito, aviltado, rolar no pó – esta é a primeira e derradeira condição para
unir-se à sua graça”. Aos olhos de Nietzsche, quem tem algo de oriental é o
monoteísmo enquanto tal, com seu culto de um deus único, onipotente e perfeito,
cuja infinita distância em relação aos homens torna impercebíveis ou anula as
diferenças existentes entre estes últimos: “O deus único como preparação moral
do rebanho”. Não pode haver aristocracia na terra se esta for moral do
rebanho”. Não pode haver aristocracia na terra se esta for cancelada e negada
no céu: “Deve haver muitos super-homens [...]. Um só deus seria sempre um
diabo!.
DOMENICO
LOSURDO, Nietzsche o rebelde aristocrata, página 965.
Junto com o mito
genealógico cristão-germânico ou cristão-ariano-germânico, Nietzsche acabou
colocando em crise também o mito genealógico “judeu-cristão-grego-ocidental”,
que é aquele hoje chamado a legitimar a missão planetária imperial do Ocidente.
Um não é menos ridículo do que o outro. Se o primeiro procura ocultar as
origens judaicas de Jesus, que se torna contra sua vontade ariano e até
germânico, o segundo afasta as origens orientais de judaísmo e cristianismo,
que se tornam sem querer tão ocidentais que são chamados a legitimar as
recorrentes cruzadas contra o Oriente. [...]. Por outro lado, mesmo entre
oscilações e contradições, Nietzsche chama a atenção para os conflitos
acontecidos entre judaísmo e cristianismo, conflitos tão ásperos que, por algum
tempo, os judeus tiveram relações mais amigáveis com o islã do que com o
cristianismo; isto é demonstrado, entre outras coisas, pela esplêndida
civilização mourisca, da qual o filósofo faz o mais alto elogio. [...]
DOMENICO
LOSURDO, NIETZSCHE O REBELDE ARISTOCRATA, páginas 965, 966.
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