Abel Ferrara ganha mostra inédita no CCBB Rio até dia 22 de abril

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Conhecido por sua imperfeição em relação ao estilo de cinema hollywoodiano, o cineasta é tido como um dos mais controversos e importantes nas últimas décadas

Abel Ferrara é conhecido por sua imperfeição em relação ao estilo de cinema hollywoodiano, mas também se distingue dos chamados “filmes B” e do cinema “de arte”. O cineasta é tido por grande parte da crítica especializada como um dos realizadores mais controversos e importantes nas últimas décadas. Grande parte da obra deste nova-iorquino do Bronx será apresentada na mostra Abel Ferrara e a religião da intensidade, que estreia hoje no Centro Cultural Banco do Brasil e vai até o dia 22 deste mês.

Serão exibidos 21 longas, três curtas e os dois episódios do Miami Vice, incluindo obras-primas como, O rei de Nova York (1990), Vício Frenético (1992) e New Rose Hotel (1998). A mostra ainda pretende promover a discussão a cerca de seu cinema e conta com a presença do próprio Abel Ferrara, que participará de um debate, no próximo dia 21.

Para o curador da mostra Julio Bezerra, esta será uma importante oportunidade para que o público possa conhecer a fundo a originalidade de Abel Ferrara.

“O Abel é muito conhecido e respeitado lá fora, mas aqui no Brasil sua obra é muito pouco divulgada. Por isso que acredito muito nas mostras de filmes, porque elas são mais democráticas e não atendem aos interesses comerciais e sim à arte. Essa sem sombra de dúvidas é uma grande oportunidade para os amantes do cinema de mergulharem na originalidade do diretor”, comenta Bezerra.

Seguindo a tradição de John Cassavetes (o cinema físico e a supremacia dos atores, dos corpos dos atores) e Maurice Pialat (o privilégio dos blocos brutos em detrimento de um equilíbrio formal do filme como um todo), assim como o interesse pelo desrespeito às regras do cinema narrativo que marcou o cinema moderno, Ferrara conta histórias diferentes de maneira diferente. Seus filmes giram em torno de policiais corruptos, assassinos psicóticos, vítimas contaminadas pelo desejo de vingança, criminosos mesquinhos, gênios do crime, viciados, adúlteros, e alcoólatras.

“São personagens violentos, mas de uma violência sem explicação política ou social. São como primos distantes de Ricardo III, o anti-herói shakespeariano por excelência, que pratica o mal gratuitamente, em uma experiência quase litúrgica”, explica Bezerra.

Ainda de acordo com o curador da mostra, Ferrara explora suas obsessões através de uma câmera atenciosa, devota ao esforço visceral de seus atores. Seu estilo é inconfundível: as ambientações silenciosas de uma Nova York sempre decadente, a escuridão, as cores desbotadas, a economia de cortes de câmera, e a direção de atores. Não importa muito o tema. Ferrara torna seu tudo o que ele toca. Seus filmes respiram suas obsessões. Para ele, a vida é genuinamente trágica. Seus personagens se degradam em Vício Frenético (1992), Driller Killer (1979), The Addiction (1995) e Enigma do Poder (1998), humilhando suas vítimas ou as torturando até a morte com uma furadeira, comendo-as vivas ou matando-as em massa. São criaturas absolutamente divididas entre uma determinada paixão ou desejo e uma força ou poder superior que os limitam. Este poder é, quase sempre, Deus - algo enraizado na severa educação de Ferrara e que se reflete em uma relação ambígua e obsessiva com os símbolos do catolicismo.

“O Ferrara é um cineasta singular, ver um filme dele é praticamente um convite à liberdade reflexiva”, afirma Julio Bezzera.

Nascido em Nova York em 1951, Ferrara e seu melhor amigo no colégio, Nicholas St. John, começaram a fazer filmes em Super-8 quando ainda eram adolescentes. O segundo escrevia os roteiros. O primeiro dirigia. Ao longo da década de 1970, enquanto ganhavam dinheiro em outros trabalhos, os dois fizeram vários curtas e um longa-metragem pornô, Nine Lives of a Wet Pussy. A estreia da dupla no circuito americano viria em 1979 com O assassino da furadeira, um filme de revirar o estômago sobre Reno, um jovem pintor interpretado pelo próprio Ferrara, que sucumbe às pressões cotidianas do mundo e começa a matar pessoas com uma furadeira portátil para aplacar sua ira. Em seus primeiros longas, Ferrara caminharia por um estilo aparentemente desajeitado, entre a linha explosiva de sua estreia e uma tentativa de aproximação com a indústria de cinema americano (realizando alguns telefilmes e dirigindo episódios de séries de sucesso como “Miami Vice”).

O Rei de Nova York (1990) e Vício Frenético, dois dos melhores trabalhos de Ferrara, marcariam pouco depois um primeiro momento de transição, onde já se é possível identificar aquilo que o cineasta viria a fazer em seguida. O crime e sordidez contaminam a narrativa. Os personagens entram em crise. Ferrara deixa de ser associado aos exploitations de baixo orçamento e começa a fazer pouca ou nenhuma concessão às normas do bom gosto ou da narrativa cinematográfica moldada em princípios canônicos, e se impõe internacionalmente como um nome a ser conhecido, respeitado e louvado no âmbito da crítica e no circuito dos festivais cinematográficos. Os chefões (1996) marcaria o término da parceria com Nicholas St. John e, o filme seguinte, Blackout (1997), revelaria uma outra transformação, mergulhos vertiginosos e uma total perda de controle sobre o mundo e sobre o cinema. Desde então, Ferrara vem assumindo pra si um projeto ainda mais radical de imersão na realidade dos seus personagens.
O CCBB - RJ fica na Rua Primeiro de Março, 66. O cinepasse custa R$ 6, válido durante a mostra, para acesso às salas de cinema I e II, por meio de senhas.

Confira a lista de filmes:

2009 Napoli, Napoli, Napoli (102 min)

2009 Mulberry St. (90 min)

2008 Chelsea on the Rocks (88 min)

2007 Go Go Tales (96 min)

2005 Maria (Mary 83 min)

2001 Gangues do Gueto (‘R Xmas /85 min)

1998 O Enigma do Poder (New Rose Hotel / 93 min)

1997 Blackout (98 min)

1996 Os chefões (The Funeral / 99 min)

1995 The Addiction ( 82 min) 18 anos

1993 Olhos de Serpente (Dangerous Game /108 min)

1993 Os Invasores de Corpos (Body Snatchers / 87 min)

1992 Vício Frenético (Bad Lieutenant / 96 min)

1990 O Rei de Nova York (King of New York / 103 min)

1989 Sedução (Cat Chaser) - exibido em suas duas versões: uma (em dvd, a oficial) tem 90 min e a outra (em beta) com 157. Esta última foi exibidas poucas vezes no mundo.

1987 China Girl (89 min)

1986 Crime Story (96 min)

1986 The Gladiator (98 min)

1985 Miami Vice (TV series) – The Dutch Oven (49 min 1985) / – The Home Invaders (49 min 1985)

1984 Cidade do Medo (Fear City / 96 min)

1981 Sedução e Vingança (Ms. 45 /80 min)
1979 O Assassino da Furadeira (The Driller Killer / 96 min)
1973 Could This Be Love (short) 26 min)
1972 The Hold Up (short) 14 min)
1971 Nicky’s Film (short) 6 min)