“Sabidamente não
há classificação do universo que não seja arbitrária e conjectural. A razão é
muito simples: não sabemos o que é o universo. “O mundo”, escreve David Hume, “talvez
seja o esboço rudimentar de algum deus infantil que o abandonou pela metade, envergonhado de seu trabalho
deficiente, é obra de um deus subalterno, de quem os deuses superiores zombam; é
a confusa produção de uma divindade decrépita e aposentada, que já morreu. É
possível ir mais longe; é possível suspeitar de que não haja universo no
sentido orgânico, unificador, que tem essa ambiciosa palavra. Se houver, falta
conjecturar sobre seu propósito; falta conjecturar sobre as palavras, as
definições, as etimologias, as sinonímias do secreto dicionário de Deus. A
impossibilidade de penetrar no esquema divino do universo não pode, contudo,
dissuadir-nos de planejar esquemas humanos, embora nos conste que estes são
provisórios.
JORGE LUIS
BORGES. Livro Outras Inquisições. Companhia Das Letras, páginas 124, 125
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