terça-feira, 31 de julho de 2012

Duas pessoas que se amaram na Terra formam um único anjo. (Jorge Luis Borges -Literatura Argentina)


Durante os últimos vinte e cinco anos da sua vida de estudo, o eminente homem de ciência e filósofo Emanuel Swedenborg (1688-1722) fixou residência em Londres. Como os ingleses são taciturnos, ganho o hábito quotidiano de falar com demónios e anjos. O Senhor permitiu-lhe vivistar as regiões ultraterrenas e partir com os seus habitantes. Cristo tinha dito que as almas, para entrarem no Céu, devem ser justas; Swedenborg acrescentou que devem ser inteligentes e depois Blake estipularia que fossem artísticas. Os Anjos de Swedenborg são as almas que escolheram o Céu. Podem prescindir das palavras; basta que um Anjo pense noutro para o ter junto dele. Duas pessoas que se amaram na Terra formam um único Anjo. O seu mundo está regido pelo amor; cada Anjo é um Céu. A sua forma é a de um ser humano perfeito; a do Céu é assim mesmo. Os Anjos podem olhar para o Norte, o Sul, o Leste e o Oeste; sempre hão-de olhar Deus cara a cara. São acima de tudo teólogos; o seu maior prazer é a prece e a discussão de problemas espirituais. As coisas da Terra são símbolos das coisas do Céu. O Sol corresponde à divindade. No Céu não existe o tempo; as aparências das coisas mudam segundo os estados de ânimo. Os trajes dos Anjos resplandecem segundo a sua inteligência. No Céu os ricos continuam a ser mais ricos do que os pobres, por estarem já habituados à riqueza. No Céu, os objectos, os móveis e as cidades são mais concretas e mais complexas que os da Terra; as cores mais variadas e  claras. Os Anjos de origem inglesa tendem para a política; os judeus para o comércio de jóias; os Alemães trazem livros que consultam antes de qualquer resposta. Como os Muçulmanos estão acostumados à veneração de Maomé, Deus concedeu-lhes um Anjo que simula ser o Profeta. Os pobres de espírito e os ascetas estão excluídos dos prazeres do Paraíso porque os não compreenderiam.

Extraído de: 
Jorge Luis Borges, O livro dos seres imaginários, Companhia Das Letras, páginas 16 e 17

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