quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Filme O FAUSTO de Alexander Sokurov (cineasta russo)



Profª Drª Ivana Bentes comentou esse filme do brilhante cineasta russo Aleksander Sokurov:
 
Filme alucinante o Fausto, de Sokurov, vendo nas sessões continuas de filmes extremos do Arthur Omar. O filme quase todo na obscuridade, sépia, e de repente uma luz impressionante (dourada, branca) com os rostos distorcidos em câmera lenta. Paisagens sublimes/devastadas; cadáveres dissecados e ratos que pulam alegremente pelas cenas. "Onde foi parar sua imaginação? Eu não tenho imaginação. Tenho uma coisa muito melhor. Eu tenho um plano" (Mefistófeles para Fausto). Sokurov sempre tem algo muito melhor, crença radical nas imagens e no cinema. E a história do Fausto de Goethe nunca foi tão contemporânea, história de um endividado literalmente até a alma e que no filme rasga o contrato. Gesto ambíguo, de libertação "Nós não vamos pagar nada" ou, para quem já vendeu tudo e está totalmente descrente, pra quê a formalidade de um contrato? 

TRAILER LEGENDADO..


http://www.youtube.com/watch?v=GoifTLZ9lRE

sábado, 5 de janeiro de 2013

BORGES. Encontros. Sete conversas com Fernando Sorrentino. (Literatura argentina)




“O trabalho essencial do escritor consiste em distrair-se, em pensar em outra coisa, fantasiar, não se apressar para dormir. Em seguida vem a execução, que já é o ofício. Quer dizer, não creio que as duas coisas sejam incompatíveis. Quando se está escrevendo alguma coisa mais ou menos boa não se sente isso como uma tarefa, mas como uma diversão. Uma distração que não exclui a inteligência, assim como o xadrez”.
BORGES 2009, página 152


...Julgo a literatura de modo hedonista. Isto é, julgo a literatura de acordo com o prazer ou emoção que me dá. (BORGES)


"É um erro supor que os contos populares, por serem anônimos, não tenham sido elaborados. Ao contrário: eles são bons porque, à medida em que passam de boca em boca, vão-se despojando de tudo o que possa ser inútil ou desagradável. Poderíamos dizer que um conto popular é uma obra muito mais trabalhada do que um poema de Donne ou Góngora, porque ao invés de ser trabalhada por uma só pessoa, foi por centenas".
BORGES 2009, página 23


BORGES, Jorge Luis. Encontros. Sete conversas com Fernando Sorrentino. Tradução: Ana Flores. Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2009.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

BORGES SABATO: Diálogos (MELHORES MOMENTOS)..Literatura Argentina




http://ebookbrowse.com/dialogos-borges-sabato-pdf-d412362982

BARONE, Orlando. (Orgs.) BORGES SABATO: Diálogos. Tradução: Maria Paula Gurgel Ribeiro. São Paulo: Editora Globo, 2005.

SABATO: (com tom caótico) Mas me diga, Borges, o senhor se interessa pelo budismo seriamente¿ Quero dizer, como religião. Ou só lhe interessa como fenômeno literário?

BORGES: O budismo me parece ligeiramente menos impossível do que o cristianismo. (Riem) Bom, talvez eu acredite no Karma. Agora, que haja céu e inferno, isso não.

SABATO: Em todo caso, se existem, devem ser dois estabelecimentos com uma população muito inesperada.
[...]
BARONE: E que opinião o senhor tem a respeito de Deus, Borges?

BORGES: (solenemente irônico) É a criação máxima da literatura fantástica! O que Welles, Kafka ou Poe imaginaram não é nada comparado com o que a teologia imaginou. A ideia de um ser perfeito, onipotente, todo poderoso é realmente fantástica.

SABATO: É, mas poderia ser um Deus imperfeito. Um Deus que não possa administrar bem o assunto, que não tenha podido impedir os terremotos. Ou um Deus que dorme e tem pesadelos ou acessos de loucura: seriam as pestes, as catástrofes...

BORGES: Ou nós. (Riem) Não sei se foi Bernard Shaw que disse: God is in the making, ou seja: “Deus está se fazendo”.

SABATO: É um pouco a ideia de Strindberg, a ideia de um Deus histórico. De qualquer forma, as coisas ruins não provam a inexistência de Deus, nem sequer a de um Deus perfeito. O senhor acaba de insinuar que acredita mais nos budistas. Se uma criança morre, de modo aparentemente injusto, pode ser que esteja pagando o pecado de uma vida anterior. Também é possível que nós não entendemos os desígnios divinos (que pertencem a um mundo transfinito), mediante a nossa mentalidade feita para um universo finito.

BORGES: Isso coincide com os últimos do livro de Jô.

SABATO: Mas me diga Borges, se o Senhor não acredita em Deus, porque escreve tantas histórias teológicas¿

BORGES: É que eu acredito na teologia como literatura fantástica. É a perfeição do gênero.

Extraído das páginas 33, 34 e 35.

A matemática é um moedor de café, que produz café sempre que coloquem café nele. Em outras palavras, a matemática não produz verdades: transforma-as em outras equivalentes.
EDDINGTON apud. SABATO. (página 82)

BORGES: “Não acredito que uma pessoa seja querida por seus livros. Alguém é querido por alguma coisa mais íntima. Na Antiguidade havia uma ideia de que a fama é justa. Vou voltar a uma de minhas manias: o anglo-saxão. O último verso da antiga gesta de Beowulf diz: “Um dos homens mais suaves e dos mais desejosos de louvor”. O que isso significa? Significa que nessa época, em que não existia a propaganda, nem nada disso, pensava-se que se uma pessoa famosa o era justa e merecidamente. Por outro lado, hoje a fama pode ser o resultado de uma manobra. (Borges, página 85)

SABATO: A idéia de que um catolicismo se baseia na sensação é um disparate. Ele se baseia no absurdo, e por isso é inatacável. Pensar com lógica na religião...Querer aplicar nossa categorias humanas e sobretudo as racionais a algo que as transcende...Um disparate.

BORGES: Fato já censurado por Deus em O livro de Jô.

SABATO: O primeiro que aparece em sua própria obra. (Ri) O primeiro escritor que faz uma obra aberta.

BORGES: Acredito que basta uma dor de dente para negar a existência de um Deus todo-poderoso.
SABATO: (Olhando-o com ironia) É provável que Deus não dê o que a pessoa quer, mas sim o que a pessoa necessita. Além disso, que Deus lhe traga uma dor de dente não é uma prova da inexistência de um Deus todo-poderoso, mas da possível existência de um Deus todo-poderoso e perverso.

BORGES: Mas então não seria o Deus que os católicos adoram:
SABATO: Claro. Mas pode provocar dor de dente sem ser perverso: A nossa lógica não vale para a infinitude.
BORGES: Há um arquétipo possível: Deus é tão generoso com o homem, que lhe dá tudo, até a possibilidade do Inferno. Mas quem sabe se esses presentes convém, não é mesmo? (Páginas 90, 91)


“[...] A única coisa de que eu tenho certeza é que cada homem se arranja muito bem com a língua que mamou, e que nessa língua pode criar uma grande literatura, a mais sutil do mundo. Cada povo cria o que necessita. Claro, desse modo, em certos povos africanos, há uma palavra diferente para cada pata de um animal, porque entre eles o animal é de enorme importância. (SABATO, página 113)

A arte é quase sempre um ato antagônico, e um homem parado pode ter muito mais imaginação do que outro que percorre o planeta. (SABATO, p. 110)

BORGES: Acho que em árabe existem quatrocentas ou quinhentas palavras relacionadas com o camelo. Mas certamente em inglês deve existir só uma.

SABATO: É natural: para um inglês, um camelo é quase uma abstração. E um beduíno tem que se espantar, se vai à Europa, com as centenas de palavras que se referem a um automóvel. Não tem sentido falar de riqueza de uma língua em comparação com outra. É tão absurdo quanto sustentar que um automóvel é melhor do que um camelo. Por isso, é tão difícil traduzir.

BORGES: Além disso, inicialmente as palavras têm um sentido que o tempo e o uso vão transformando. Por exemplo, eu descobri que o espanhol “Blanco” e o inglês “Black” têm a mesma origem. “Black” queria dizer “sem cor”, e certamente “Blanco” também.

SABATO: Sempre se usou branco no luto, até que se começou a usar preto na Espanha, acredito que na corte de Felipe II. De modo que confirmaria o que o senhor está dizendo sobre a identidade inicial entre “Black” e “Blanco”.
Página 114.